domingo, 25 de janeiro de 2015

No Mural do Facebook II


Brasilbrás
A inconsciência e a apatia política do brasileiro não é uma coisa qualquer. É um mal entranhado na nossa formação mais remota. Por isso governantes, seja de que partido forem, usam e abusam dos nossos direitos e bens. Mesmo a minoria politizada e opinativa denuncia no geral os efeitos, pois não percebe as causas profundas do nosso atraso e problemas que se arrastam através de séculos. O Estado brasileiro, por exemplo, não mudou essencialmente desde as origens do império colonial português. É o Estado patrimonial, privatizado por uma casta que governa em benefício próprio e dos seus parentes, apadrinhados, amigos e associados. Nossa chamada elite é apenas uma clientela, como bem observou Evaldo Cabral de Melo. O Estado concentra o poder usando seu poder de agente interventor na esfera econômica para pilhar impiedosa e sistematicamente a sociedade. Segundo Eduardo Giannetti, 60% da nossa renda salarial procede do Estado. Isso evidencia o quanto a esfera do capital privado é restrita. Todos os países de comprovada eficiência econômica no capitalismo moderno funcionam exatamente de modo contrário. No país das estatais, ai de quem ousar sequer sugerir a privatização de um monstrengo como a Petrobrás.
Não falta quem denuncie a corrupção, sobretudo agora, quando assistimos à investigação de mais uma colossal pilhagem que provavelmente vai dar em nada ou em muito pouco, já que todos os partidos de maior força estão implicados. Para bom entendedor: vão se associar para impedir o avanço efetivo das investigações na esfera política. Quem paga a conta? O contribuinte, é claro. A sociedade apática e inconsciente da pilhagem sistemática a que é submetida continua dormindo nas filas e macas depredadas pela corrupção e o parasitismo público. Temos uma das mais altas cargas tributárias do mundo, com o agravante de que o Estado bem pouco retribui em serviços e deveres constitucionais o que cobra da sociedade, e agora vem por aí mais arrocho. Vamos novamente pagar as contas astronômicas da corrupção entranhada nas estatais e em todo o aparato estatal. Mas nem os críticos mais veementes ousam falar em privatização. Falar nisso é incorrer numa heresia, é coisa de neoliberal entreguista. E assim continuamos pagando contas sem resgate cada vez mais extorsivas. O que nos consola é a complacência fatalista com que nos gozamos e gozamos de tudo, sobretudo o circo que não pode parar. O carnaval já começou de costas para a crise que se agrava enquanto a classe dirigente e sua clientela continuam saqueando a sociedade inconsciente e apática. Merecemos continuar sendo um país de segunda categoria como se isso fosse uma praga ou fatalidade. E quase todos se consolam cantando o país da esperança, como se esperança fosse realidade. Nossa miséria é tão grande que sequer nos consola esperar sentado. Tem fila até para a esperança.
Facebook, 20 de janeiro de 2015

Je suis Charlie

Acho que minha amiga Deborah Echeverria pisou em falso ao endossar argumentos de certos relativistas e críticos do Ocidente. Refiro-me a quem diz que não é Charlie. Para começar, o endosso à frase, ou slogan, não significa adesão irrestrita ao humor da revista Charlie Hebdo. Significa, antes de tudo, defesa da liberdade de expressão. Portanto, rejeição à barbárie destrutiva, com perdão do truísmo que se justifica como forma enfática. Lembrando a definição da liberdade proposta por Rosa Luxemburgo: Liberdade é sempre e exclusivamente a liberdade de discordarem de nós. Afirmar que o islamismo rejeita as grandes conquistas da modernidade, fruto da tradição iluminista cujo foco mais dinâmico foi a França do Século XVIII, não é incorrer em crime de intolerância ao islamismo, muito menos justificação do imperialismo ocidental.
É claro que há intolerância de um e de outro lado. Mas todas as conquistas democráticas, toda a tradição de reconhecimento e respeito pelo outro é obra do Ocidente. Isso é tão verdadeiro que somente no Ocidente existe relativismo cultural. Nossas universidades estão cheias de radicais de cátedra usando os sofismas do relativismo para atacar o Ocidente e defender todas as culturas diferentes ou incompatíveis com a tradição de tolerância fundada no Ocidente depois de muitos séculos de luta. A diferença é simples: tentem imaginar um Foucault ou um militante de qualquer movimento em defesa das minorias no Oriente Médio
Facebook, 10 de janeiro 2015.

P. S. – O comentário acima, postado no mural do Facebook, provocou a incompreensão previsível. Os limites do espaço já de partida me obrigam a condensar e também simplificar meus argumentos. Não bastasse tanto, a natureza polêmica do tema concorre acima de tudo para gerar todo tipo de controvérsia e apreciação impertinente. Não sou de frente ampla nem de voz unida. Nunca militei em partido político ou professei qualquer fé religiosa. Ademais, deixei claro o sentido em que endossava a frase que correu o mundo como um símbolo de resistência à intolerância e ao terror: Je suis Charlie. Pois não faltou quem me interpelasse acerca dos limites da liberdade de expressão, do meu eurocentrismo e por fim me incluísse na corrente dos conservadores intolerantes. Apesar de tudo, insisto em me explicar fiel a um princípio de respeito à opinião alheia, à opinião do leitor, seja quem for, até que me dou conta de que esbarro em paredes surdas e me calo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário