sexta-feira, 3 de junho de 2016

No Mural do Facebook XVIII


O Brasil não existe

Antes, bem antes de ser brasileiro, eu já queria nascer no Brasil. Quem não gostaria de viver num país de povo amante da diversidade, isento de preconceitos, festivo como o carnaval, inventivo como o futebol e as escolas de samba, sensual como a mulata que passa requebrando com o pudor de quem anda nua, como disse um dos cultores das nossas virtudes?
Pensei nessas tolices porque ando relendo as memórias de Stefan Zweig, o judeu errante que disse noutras e célebres palavras o que rabisquei acima. Zweig cativou os brasileiros, sempre mais nacionalistas do que outros nacionalistas, quando ventilou profecias paradisíacas sobre o nosso futuro. Brasil, país do futuro, ou coisa parecida. Nasci, tornei-me brasileiro, estou agora bem mais perto da morte do que do futuro e no entanto o futuro paradisíaco nunca chegou. O Brasil que sonhamos, assim como o de Zweig, é sempre o Brasil de amanhã.
O problema do futuro, não importando quanto seja paradisíaco, é este: não é nunca hoje. Hoje é o único tempo real. Portanto, até quando nos consolaremos com um país que será sempre amanhã? Amanhã, já cantava o outro, que acabou cantando o pior do presente, amanhã vai ser outro dia. A frase, que nos apaixona por ser uma metáfora, é sempre uma promessa adiada, sempre uma esperança: o bem que se quer e não se tem. Nenhum país que inventou seu presente precisa consolar-se com um futuro improvável. Como não sabemos o que fazer do que somos coletivamente, conspiramos, insultamos e nos intoleramos (com perdão do dilmês) quando os males que tramamos caem sobre nossas delirantes cabeças. Como não nos sabemos, nem nos queremos como somos, penduramos a consciência na ilha de Marajó, seguindo o exemplo de Macunaíma, herói da nossa gente, e culpamos o outro. O culpado é sempre o outro.
Ah, antes que me esqueça: Stefan Zweig, coitado, não pôde viver o Brasil do futuro porque se suicidou no presente. Aliás, tudo é sempre o presente. Brasileiros, acordem para o presente. Desconfio de que não falei do exclusivismo político que colonizou a vida dos chamados brasileiros conscientes, politicamente esclarecidos e responsáveis. O que subjetivamente sei é que me sinto como Stefan Zweig isento da queda no suicídio. Quero dizer, sinto-me estrangeiro no país do amanhã, solitário no país do hoje. E com franqueza: não acredito nessas maravilhas que vemos espelhadas na imagem nacionalista que cultuamos. Será que algum dia aprenderemos a conjugar nossa realidade (este princípio imperativo, como diria Freud) no presente do indicativo?
(Postado no Facebook, 23 de maio de 2016).


Culto da personalidade:
Quem conhece a história do comunismo, em particular o stalinismo, sabe do que falo. Stálin, um dos maiores tiranos da história, foi objeto de culto, inclusive de intelectuais que se supõem a consciência da humanidade. A verdade, que o próprio PC soviético passou a admitir desde o Congresso de 1956, é ainda ignorada por alguns comunistas retardados, que não suportam o choque doloroso da verdade. Enquanto suprimia ou tiranizava a vida de milhões de soviéticos e inimigos externos, Stálin era celebrado por escritores como Jorge Amado e Pablo Neruda (cito apenas os dois comunistas latino-americanos mais célebres) como pacificador dos povos e benfeitor da humanidade.
Observando a sociedade das massas e o culto desvairado que milhões devotam a ídolos do rock e do futebol, não é difícil compreender porque serem humanos que nada fizeram de humanamente significativo ou não sabem que são poeira da história, antes de tudo por aceitarem essa condição, cultuam delirantemente esses ídolos. Freud estudou as bases psicológicas desse fenômeno cada vez mais corrente na sociedade das massas no seu ensaio "Psicologia das Massas e Análise do Ego" (entre nós erradamente traduzido como Psicologia de Grupo, etc). Embora neste parágrafo refira-me até aqui ao culto dos ídolos da cultura de massas, o fenômeno estende-se igualmente para a esfera da política, tanto que comecei aludindo a Stálin como objeto de culto da personalidade.
Sem nem de longe comparar o culto a Stálin com o culto a Chico Buarque (pois seria uma analogia infame, coisa que leio petista fazendo todos os dias), quero protestar contra blogueiros servis, embora alguns sejam comprovadamente pagos, que diariamente infiltram na minha página posts de culto a Chico Buarque. Como o que acima escrevi já deixa implícito, não cultuo nenhum ídolo. Cultuar ídolos é algo indigno de um homem que luta para ser livre, na medida em que isso é possível. Esta é minha luta e minha ambição. Tenho compromisso com minhas convicções e com a minha consciência. Logo, não cultuo Chico Buarque nem ninguém. Uma coisa é admirá-lo como nosso maior compositor, segundo apenas para Tom Jobim; outra é isso que aqui critico. Ademais, há muito deixei de ter razões objetivas para admirar ética e politicamente o Chico Buarque que já admirei. Por isso tenho removido esses intrusos e intrusas que se enfiam na minha página para cultuar Chico Buarque. Alguns trazem o timbre "Patrocinado". Por quem, é a única coisa que gostaria de saber. Afastem-se de mim todos esses que carregam no lombo de escravo mental e moral todos os santos de pés de barro da política e da cultura de massas.
(Postado no Facebook, 29 de maio de 2016).

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