domingo, 17 de janeiro de 2010
Autor, Leitor e Seguidora
Depois de 45 dias mourejando neste blog, atravesso ainda noites em claro indagando-me atormentado se acaso conquistei um leitor fiel. Privado de evidência que me ajude a reconciliar o sono, recorro a Brás Cubas, que no prólogo de suas célebres memórias duvida de que seu livro seja acolhido por mais de cinco leitores. Essas aflições que aqui desato meio constrangido sugerem o quanto o autor é escravo do leitor. Salvo gênios movidos pela necessidade imperiosa de expressão, como é o caso de Kafka e Fernando Pessoa, é muito improvável que um autor, órfão de leitor, persista em escrever para paredes vazias, ou para a esfinge de uma posteridade que lhe recusa um magro grão de certeza. Se Italo Svevo, meu escritor italiano preferido, deixou-se abater pela falta de leitor ao ponto de renunciar à literatura, o que dizer de mim? Svevo foi salvo por Joyce, leitor que por certo vale por mil, ou um milhão. Quem no entanto me salvará?
45 dias trabalhando sem ganho, como um subempregado faminto, e além de tudo insone. Como saber se depois de tanto conquistei de fato um único leitor fiel, um que me ampare na minha obscuridade e me transmita a certeza de que essa garrafa que lanço às ondas de um oceano de indiferença me salvará do naufrágio que dentro da noite figuro na solidão da biblioteca? Não sei sinceramente se conquistei um único leitor fiel. Diante da incerteza, que felizmente não me paralisa como paralisou Svevo, insisto daqui em piscar o olho para esse leitor invisível, insisto em rodar minha bolsinha nos vãos da noite deserta esperançoso de que esse leitor improvável pisque de volta para mim e simplesmente me diga: estou todos os dias no seu blog. É como eu disse: o autor é um escravo do leitor que ele de resto nem sabe quem é. Pior: nem sabe se existe.
Escravidão por escravidão, talvez a menos impiedosa seja a que Balzac escolheu, ou o destino lhe impôs: a escravidão imposta pela própria literatura. Quem dera eu fosse tocado por esse sinal invisível do destino, essa estrada ou calvário que seguimos por dever de ação e vocação. Assim esqueceria um pouco meu improvável leitor, ou pelo menos não dependeria dele ao ponto de me valer das muletas do Lexotan para enfim dormir em paz. Como canta Aldir Blanc: “Toma Peter Pan / só um Lexotan / pra que tanto amor não te enlouqueça”. A essa altura já começo a desconfiar de que meu único leitor, se é que ele existe, já anda me confundindo com folião de parada gay. Logo, convém passar para a seguidora que completa o título da crônica.
Como observa Machado de Assis, a gente precisa explicar tudo. Por que leitor e seguidora, por que a discriminação de gênero? Bem, no caso do leitor limitei-me a seguir a convenção literária e linguística, convenção que no caso vale por tradição. No caso da seguidora, um neologismo que entra afinal nas minhas crônicas, preciso explicar-me melhor. Começando pelo neologismo, confesso envergonhado que ignoro ainda o sentido exato deste termo na linguagem dos blogues. Optei por seguidora por ter o consolo de registrar três seguidoras no total de seis que arduamente logrei subornar. São Andrea, Lillian e Mariana. Tenho adicionalmente três seguidores: Dirceu, Pedro Gabriel e... eu próprio. Como meu código de gênero é prioritariamente feminino, se há empate as mulheres ganham. Por isso escrevi seguidoras no título.
Se o leitor, meu improvável único leitor, leu acima subornar, leu corretamente. Confesso que subornei minhas seguidoras. Foi trabalhoso, pois algumas ergueram barreiras quase incorruptíveis, mas ao cabo venci. Para isso mobilizei os engenheiros dos mensalões, mobilizei publicitários, até a turba da Uniban. Entre a sedução e a intimidação, acabei dobrando todos. Menos eu, claro, já de partida dobrado. Bastaria dizer que sigo a mim próprio. Um homem que segue a si próprio é capaz de tudo para seguir o blog que ele próprio escreve.
Mas chego ao fim da crônica sem bem saber o que é seguidora. Já que minhas seguidoras não me esclarecem, resta-me concluir supondo que convém seguirem antes a mim, ainda que não saiba para onde vou, do que esses pastores de igreja que nos tratam como meros depositantes de suas contas bancárias. Antes eu do que esses filósofos da autoajuda escolados em um único e vil ofício: o de ajudar a engorda de suas próprias rendas. Em suma, fujo desses mercenários que confundem meu bem com meus bens.
Recife, 14 de janeiro de 2010.
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Querido,
ResponderExcluirSou sua primeira e fiel seguidora, mas gostaria que me seguisse na próxima terça.
Bj.
Lillian:
ResponderExcluirImagino o autor sem leitor e sua fiel seguidora andando pela vida e pelas ruas do Recife sem saber aonde irão. Ninguém saberá amanhã quem segue quem, quem para onde vai. Mas serei seu seguidor, Lillian, pois do contrário correrei o risco de perder minha primeira e fiel seguidora.
Fernando.
Nando, a qual quimera você isuloriamente segue? A ilusão de ser lido ou a de ser entendido? Nandinho, Nandoca, Modesto Carone numa de suas Kafkices já disse que o escritor é aquele que não sabe se sabe escrever. Escritor é você meu querido amigo que sabe não saber saber. Pedrucho.
ResponderExcluirPedro:
ResponderExcluirVocê que é meu seguidor, mais amigo do que seguidor, sabe que o autor precisa do leitor tanto quanto o analisando precisa do analista.
Fernando
Fernando, você reparou que Borges também é a cara do mordomo dos Aristogatos????
ResponderExcluirAcho que me tornei sua quarta seguidora, pois estou adorando seu blog!!
ResponderExcluirAbraços,
Cecília.
Cecília:
ResponderExcluirMuito grato pela leitura e a companhia.Abraços de
Fernando.