quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Drummond



Releio Farewell, o último livro de poemas de Drummond. Estou agora vivamente impressionado com o fato de não haver antes concedido a este belo e sofrido livro a atenção merecida. Estava ontem remexendo as prateleiras à procura de uns livros e de repente o vi diante de mim. Abri-o ao acaso e logo o primeiro poema me tocou profundamente. Então deixei-o à cabeceira de minha cama, pois queria ler alguns outros antes de dormir. Foi o que de fato fiz. Novamente senti-me tomado por sensações intensas, como se a voz de Drummond, sussurrando-me segredos provindos do fundo do tempo, misteriosamente ressoasse na madrugada fechada sobre o meu quarto. Lendo os poemas, em muitos, com certeza mais que em qualquer dos livros canônicos de Drummond, retive a dor estoica com que se debruçou sobre a velhice tardia, no fundo de tudo recolhendo a dor do farewell definitivo. Um passo além e me vi retraçando a linha embaçada do niilismo insinuando-se em entrelinhas dolorosas. Por fim me vi a mim próprio lentamente deslizando para a borda do abismo que tragou meu amado Drummond, assim como um dia também me tragará. Foi quando o poema abaixo quase que se fez em mim, pois pouco, bem pouco o trabalhei depois de me sentar à mesa para rabiscar os versos, alterar-lhe duas rimas e acrescentar-lhe a estrofe de fecho.
Drummond
Drummond Drummond
Tão longe vibrava o som
Que o ouvido se confundia
Entre teu nada e teu tom.

Drummond Drummond
Tão perto retinha o som
Que o eco se refazia
E o mundo enfim era bom.

Drummond Drummond
Que trilha percorre o som
Quando o que era poesia
No nada já dissolve?

E nada aqui se resolve
Nada no antes, no além
Pois tudo que o ouvido ouve
Não é Drummond nem ninguém.

Recife, 17 de agosto de 2010.

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