quarta-feira, 17 de agosto de 2011

As Almas de Júlia S.



As almas de Ju são tantas
Tantas as almas de Ju
Uma que à noite se espanta
Outra comendo pão cru
Umas torcendo a garganta
Outras despindo o rei nu.

As almas de Ju são tantas
Errando de norte a sul
Umas vestidas de santas
Outras bailando no azul
Umas requebro de ancas
Outras tormento de um blues.

As almas de Ju são tantas
Tontas vagando nas salas.
Entre perdidas e santas
Quem há de uni-las e atá-las
Quem na paisagem mais branca
Num só relance abarcá-las?

Sendo ela própria e outras
Que sob o teto abriga
Júlia talvez queira poucas
Na teia que se fabrica
Talvez não ache nas loucas
A louca irmã e amiga.

No lado em que se extravia
De porta em porta batendo
A alma irmã anuncia
Dentro da treva do dia
Um outro em Júlia nascendo
Feito de luz e poesia.

A alma que chora e canta
É a mesma que acaricia
Assim como a que descanta
A que no fundo eu queria.
Das almas perdi a conta
De Ju as contas do dia.

De si assim desavinda
Júlia não vê a beleza
Da alma que vibra ainda
No cerne da natureza
Fundindo a face mais linda
Num véu de vaga tristeza.

Fosse eu um outro poeta
Herdeiro da criação
Eu lhe doava completa
A irretocável canção:
A alma branca na preta
Fundidas no coração.

Mas é na linha da falta
Que a gente afia a razão
A vida mais plena e alta
Colhe as sementes no chão.
No metro estreito da pauta
A nota da perfeição.

Recife, 12 de dezembro de 2003.

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